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Processo criativo

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O INVENTÁRIO DO MUNDO PARA DOAR AO CRIADOR: O PROCESSO CRIATIVO DE ARTHUR BISPO DO ROSÁRIO

O pensador, escritor e crítico de arte Ludwig Borne (1786-1837), judeu que viveu onde futuramente seria a Alemanha, certa vez recomendou que quem quisesse ser escritor deveria se fechar num quarto durante três dias e escrevesse com toda a sinceridade possível o que pensa sobre os principais problemas pessoais e políticos. O fato é que isto pode ser aplicado a qualquer tipo de artista no seu processo criativo. Nos dias de hoje, isolar-se num quarto é um luxo. Deste ponto de partida, analisaremos brevemente a obra de Arthur Bispo do Rosário (1909 ou 1911?-1989).

Somente um Louco? Somente um Gênio? Ou um artista talentoso, que (por acaso) tinha um problema mental? Muito se discute até hoje sobre a vida e obra deste sergipano diagnosticado como louco que passou mais de 50 anos de sua vida dentro de um hospício no Rio de Janeiro. O que é inegável é que este artista – ainda desconhecido do grande público brasileiro – deixou uma obra impressionante, que maravilha muitas pessoas mundo afora; é comparado a Marcel Duchamp, Jean Michel Basquiat, Andy Warhol, dentre outros. Existe muito na internet sobre a vida de Bispo, e não é intenção deste texto dar detalhes de sua vida, mas apenas o essencial: pobre, negro e analfabeto, foi diagnosticado como portador de esquizofrenia paranoide, tinha delírios carregados de misticismo católico e manias de grandeza, chegando a se considerar Cristo. Inicialmente um “louco agressivo”, foi se tornando comportado aos poucos, com o avanço da idade. Sua obra prima é o Manto da Apresentação (imagem de capa), que bordou durante 30 anos para usar quando se apresentasse diante de Deus; do lado de dentro do manto (imagem 1), bordou nomes de pessoas conhecidas e queridas, que segundo seu entendimento mereciam de Deus um lugar no paraíso.

Quando entrava em surto provocado pelo seu transtorno mental, pedia para ser isolado no quarto, e era nesses dias que mais produzia artisticamente. Usava todo tipo de sucata que se pode imaginar, ressignificando os objetos, criando colagens e bordados (imagens 5 a 8). Uma matéria-prima inusitada era o fio azul do uniforme de interno e dos lençois do hospício, que ele desfiava e reutilizava (imagens 2, 3 e 4). Sua obra servia para a missão que ele imaginava ser sua: Recriar o mundo para apresentá-lo a Deus no dia do Juízo Final. Mesmo com o desequilíbrio mental, Bispo conseguiu produzir aproximadamente 800 peças que são consideradas a mais pura arte contemporânea, sem que ele sequer tivesse ideia do que era uma exposição de arte. Lembremos que seu reconhecimento internacional só veio anos depois da morte, na Bienal de Veneza de 1995. A primeira vez que suas obras foram expostas na Bienal de São Paulo foi em 2012.

Como podemos imaginar, Bispo não tinha as preocupações de pessoas “normais” (entre milhões de aspas, claro), tais como as inúmeras obrigações financeiras e sociais (ganhar dinheiro, economizar dinheiro, contas a pagar, vida familiar, vida laboral, compromissos sociais, etc.). A ausência de tudo isso pode ter dado a ele um tempo precioso para se dedicar ao seu processo criativo. As crises de esquizofrenia podiam servir como um gatilho para a execução das peças, uma maneira de apaziguar o caos mental interno, produzindo assim a nova versão do mundo segundo a paz e harmonia desejáveis pelo Criador Divino.

Finalizo este pequeno ensaio com uma outra citação, também de Ludwig Borne, que fala dos escritores, mas cujo ensinamento pode se estender a qualquer tipo de artista:

“Não é espírito, mas caráter o que falta à maioria dos escritores para serem melhores do que são. Essa fraqueza provém da vaidade. O artista, o escritor, deseja dominar e superar seus camaradas; mas para dominar alguém é preciso colocar-se ao lado dele, e para superá-lo é preciso marchar sobre o mesmo caminho que ele. Os bons e os maus escritores têm todas as coisas em comum. O mau se encontra inteiramente no bom, este último possui algo a mais. O bom segue o mesmo caminho que o ruim, mas ele vai um pouco mais longe”.

Talvez esteja aí o problema do artista que o professor Sérgio Klepacz relata ter conhecido na estrada (vídeo da aula 1 do curso), cujos azulejos pintados não despertavam qualquer vontade de aquisição, por não ver arte ali. O indivíduo provavelmente não ousava em ir além do caminho fácil e confortável de pintar a clássica cena de praia, ou não queria ir mais longe.

Bispo, totalmente desprovido de vaidades, não tinha frustrações, não tinha o desejo de superar ninguém (pois sequer tinha consciência do “mundo da arte”); foi além do que muitos artistas puderam ir, e foi mais longe, certamente, o que o torna sem dúvida um talentoso grande artista, apesar de todas as suas dificuldades.

Notas do aluno:
1) As imagens foram todas tiradas da internet.

2) SUGESTÃO DE FILME: No fim do vídeo da aula 1, o professor Sérgio Klepacz fala de um escritor que teve uma tragédia pessoal, escreveu um livro que virou obra-prima e nunca mais teve inspiração para escrever, vivendo somente do tal livro bem sucedido. Esta situação me lembrou bastante o enredo do magnífico filme italiano “A GRANDE BELEZA”, de 2014. Fica a sugestão para que todos assistam a este filme.

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